Na paisagem bucólica do bairro Santo Antônio de Lisboa, em Florianópolis, resiste um dos mais emblemáticos patrimônios históricos da cidade: o Casarão e Engenho dos Andrade. Mais do que uma construção preservada, o local representa uma das mais autênticas manifestações da cultura açoriana na capital catarinense — os engenhos de farinha.
A tradição dos engenhos em Florianópolis remonta ao século XVIII, com a chegada de imigrantes açorianos entre 1748 e 1756. Ao se estabelecerem na ilha, impossibilitados de cultivar trigo como faziam nos Açores, esses colonizadores passaram a trabalhar com a mandioca, planta já utilizada pelos povos indígenas. Dessa adaptação surgiu uma atividade que marcaria profundamente a economia e o modo de vida local: a produção artesanal de farinha, feita em engenhos movidos à tração animal.
Santo Antônio de Lisboa foi um dos principais polos dessa cultura. A freguesia recebeu, ainda no século XVII, um contingente expressivo de açorianos que se dedicaram à agricultura de subsistência. A produção de farinha ganhou relevância não apenas regional, mas também nacional — durante a Guerra do Paraguai (1864–1870), por exemplo, a chamada “farinha de guerra” produzida na ilha teria abastecido tropas aliadas argentinas e uruguaias.
Hoje, poucos engenhos resistem ao tempo. Segundo o Cepagro (Centro de Estudos e Promoção da Agricultura de Grupo), restam poucos ativos em toda a cidade. Entre eles, destaca-se o Engenho dos Andrade, o mais antigo ainda em funcionamento, cuja edificação remonta a 1860.
Um espaço vivo da história de Florianópolis
O Casarão e Engenho dos Andrade foi adquirido em 1920 por Agenor José de Andrade, que passou a morar e trabalhar no local com sua família, conferindo-lhe o nome atual. A estrutura é composta por uma casa residencial de estilo colonial, com sala, quatro quartos, corredor central e cozinha aos fundos, originalmente conectada ao engenho. O engenho, do tipo “cangalha”, utiliza a força de bois para movimentar os equipamentos de produção de farinha.
Encerradas as atividades produtivas em 1985, o local foi restaurado em 2003 e transformado em um espaço cultural e educativo. Desde então, integra o “Circuito Histórico de Santo Antônio de Lisboa”, oferecendo oficinas, visitas escolares, apresentações do tradicional boi de mamão e exposições permanentes de artistas locais, como Neri Andrade e Cláudio Andrade, este último um dos últimos santeiros de Santa Catarina.
Um legado que resiste e patrimônio reconhecido
O Casarão e Engenho dos Andrade é mais do que um ponto turístico que merece estar na lista sobre o que fazer em Florianópolis. É um testemunho de uma tradição que moldou parte da identidade da cidade. Ao preservar sua arquitetura, seus modos de produção e suas manifestações culturais, o engenho cumpre um papel essencial: manter viva a memória da cidade e das famílias que a construíram.
Prova disso, o Engenho dos Andrade é tombado como patrimônio histórico municipal e estadual desde 2002, conforme o Decreto nº 5.916. Em 2024, recebeu novo reconhecimento: os saberes e práticas tradicionais dos engenhos de farinha de Santa Catarina foram declarados Patrimônio Imaterial do Estado pela Fundação Catarinense de Cultura (FCC), durante a 24ª edição da Farinhada do Divino, realizada no próprio engenho.
Aberto à visitação de segunda a sábado, das 9h às 12h e das 14h às 19h, o espaço é uma verdadeira janela para o passado de Florianópolis. Informações e agendamentos podem ser feitos pelos telefones (48) 3235-2572 e (48) 99615-4080 (WhatsApp), ou pelo e-mail engenhoandrade@gmail.com.
E anote na agenda:
Nos dias 24 e 25 de agosto, acontece a 25ª Farinhada do Divino, no Engenho dos Andrade. O evento é regado com muita farinha de mandioca polvilhada e derivados, gastronomia típica de engenho, shows musicais e folclore.
Siga o @engenhodosandrade para conferir todas as atrações.
